A ARTE DA CONSTRUÇÃO
Por Eduardo Farah*
“Construção” é uma palavra que me agrada muito, porque se refere tanto a um processo, quanto ao seu resultado. Definimos como “construção” um prédio sendo erguido, ainda em meio a obras, bem como o edifício já pronto. E isso nos permite entender que a construção é algo que nunca termina, pois ela está sempre acontecendo e, ao mesmo tempo, gerando novos resultados. É assim, também, com nossa vida – pessoal e profissional (vale dizer que, de verdade, é impossível separar as duas). Estamos sempre na construção. E perceber esse movimento em nossas vidas, bem como entender suas etapas, pode servir como um poderoso combustível para que nossa consciência fique mais alerta, observando quanto estamos alinhados com nossos verdadeiros valores e objetivos na vida. No caso das empresas, esse exercício pode trazer informações preciosas sobre os fins e os meios em que a organização está investindo. Construção é uma palavra feminina. Ao contrário do que muitos possam imaginar, ela não necessita apenas de ação e movimento, características normalmente associadas ao universo masculino, mas também de aceitação e paciência, presentes no mundo feminino. A construção, como todo ser humano, é tão melhor quanto mais equilibrados esses elementos se encontram. É daí que vem a sua força e capacidade de concretização. A construção sempre começa por uma escolha. Tomamos a decisão de chegar num certo ponto, e então iniciamos a jornada. Aí começa o primeiro exercício de auto-observação: será que estamos fazendo a escolha certa? Em que baseamos nossas decisões? È certo que todos nós, seja na família, na vida social, ou na empresa, estamos buscando a felicidade. Mas, a depender de nossa história pessoal, dos valores de nossa cultura e de diversos outros fatores, podemos realizar essa busca de forma distorcida. Pode parecer estranho, e certamente de maneira distorcida, mas o chefe de uma quadrilha de assaltantes também está buscando a felicidade, à sua maneira. Será, por exemplo, que nossas escolhas são baseadas no medo ou no amor? Afinal, podemos decidir construir um muro para nos defender, uma casa para receber os amigos, ou um templo para orarmos. Cada construção trará um resultado diferente. É como na agricultura. Essa é a hora em que decidimos se vamos plantar milho, arroz ou feijão. Certamente vamos colher o que plantamos. Em outras palavras, vamos receber amor, raiva, alegria ou tristeza, dependendo do que decidimos plantar. A diferença em relação ao agricultor é que nós, muitas vezes, estamos tão confusos, tão atolados no nosso dia-a-dia, que não prestamos atenção no que estamos plantando. Talvez porque não saibamos com clareza o que realmente queremos construir, e por quê. Nas empresas isso fica muito claro. Muitos líderes e funcionários não sabem exatamente o que estão construindo: Resultados financeiros? Status? Auto-estima? Poder? Contribuição social? Um mundo melhor? Felicidade (individual e coletiva)? A decisão tem de ser clara para todos e compartilhada, para que todo o grupo possa caminhar alinhado para alcançar seu objetivo. Quando sabemos, de verdade, o que queremos construir, inicia-se a fase do planejamento, em que avaliamos os recursos, o tempo de que dispomos e quais são as prioridades. Nesse momento, também, precisamos estar bem alertas. Um leve descuido faz com que planejemos construções megalomaníacas, fora da realidade, que seriam abortadas se analisássemos com cuidado nossa capacidade psicológica e material de realizá-las. É comum vermos construções inacabadas, paradas no meio, por falta de uma boa fase inicial, gerando um grande prejuízo a todos. O inverso também ocorre, com planejamentos aquém da oportunidade, normalmente por medo, por não se apostar em nossos sonhos (sem tirar os pés do chão) ou por subvalorizar o próprio potencial da construção. Após o planejamento vem uma inevitável e nem sempre agradável etapa do processo: limpar e ajeitar o terreno. É muito raro começar uma construção num espaço que já esteja totalmente adequado para esse fim. Em geral, temos de separar lixo ou cortar a mata densa. E, saindo da metáfora, isso significa, por exemplo, olhar para bloqueios psicológicos e crenças que atrapalham que alcancemos nosso objetivo, ou trabalhar relacionamentos pessoais e profissionais complicados, ou a descrença e a crítica dos outros em relação ao nosso projeto. Enfim, vem a execução em si. Montar alicerces, construir muros etc. E, ao contrário do que acontece nas obras reais, na construção da vida não podemos contratar pedreiros e peões de obra e ficar apenas no cargo de coordenação. De uma certa forma, exercemos todos os papéis, pensando e elaborando, mas também carregando peso e dando nosso suor. E isso é importante para nos lembrar que, nas construções coletivas, como as de uma empresa, todos os papéis são essenciais. Por mais ingênuo que pareça, ninguém é mais importante que ninguém. Cada um tem o seu papel e peso no resultado final, que definitivamente depende de todos. Por fim, mensuramos resultados, e, durante todo o processo, acompanhamos e avaliamos nossa construção. Será que a direção que tomamos inicialmente continua correta? Ou precisamos de ajustes? Talvez possamos melhorar a execução, contando com colaboradores e materiais melhores, ou contendo gastos excessivos? É importante lembrar que é impossível se enganar numa construção: se ela é construída em bases falsas, ou com material de segunda, apenas para economizar, ela inevitavelmente cai. Não adianta, por exemplo, uma empresa fazer uma ação social, e divulgar isso aos quatro cantos, se os funcionários e clientes não são tratados com respeito. Além de tudo que já foi dito, é importante reconhecermos que muitas vezes, por mais ilógico que possa aparentar, há uma parte nossa que não quer a construção, que age à nossa revelia, que põe tudo a perder. Se você já chegou a esse entendimento, ótimo. Afinal, só essa percepção o ajudará muito a ir além dela, a assumir plenamente a sua capacidade e responsabilidade na construção. Aquele projeto que está esperando para ser aprovado, o novo produto, a meta de vendas, a equipe de atendimento, o novo escritório e tantas outras construções dependem de nós. E como já dissemos, a construção não tem fim. Cada construção que terminamos serve de base para fazermos uma nova construção. Uma usa o alicerce da outra. Por outro lado, não adianta nos desesperarmos para ver o resultado da nossa construção atual, como se ela fosse a única. Como ela é interminável, vale a pena percebermos que a beleza está no processo, na direção correta. Podemos dizer que a construção não é um lugar de chegada, mas um meio de transporte. E sigamos construindo, com qualidade.
* Eduardo Elias Farah é doutor em administração pela EAESP/FGV, palestrante e consultor especializado e sócio da Chama Azul Business Care.
E-mail: edu@chamaazul.com.br
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